sexta-feira, novembro 24, 2006

Amor eterno

Nelson Rodrigues


Sou uma das raras pessoas das minhas relações que acredita no amor eterno. Já escrevi mil vezes: todo amor é eterno e, se acaba, não era amor. O amor não morre - vivo eu dizendo. Morre o sentimento que é, apenas uma imitação do amor muitas vezes uma maravilhosa imitação do amor.

Diz Oswaldinho, na minha peça Anti-Nelson Roddrigues: “Quando eu a vi, senti que não era a primeira vez, que eu a conhecia de vidas passadas.” Isso quer dizer que só quem ama conhece a eternidade. Isso é romantismo de maneira despudorada. Isso é amor. Sou uma alma da Belle

Époque e de vez em quando me pergunto o que é que estou fazendo em 1974.
Mas Nelson, não haverá má fé inconsciente na idéia de que se o amor não é eterno ele não era amor?

O amor eterno pode parecer, de fato, uma justificativa de todas as infidelidades. Procurando o seu amor eterno, o homem não seria fiel a ninguém. Acontece que eu já confessei que nunca fui fiel e considero isso uma mácula que tenho quase como um estigma físico. Mas conheço vários casos de amor eterno.

Um deles: o de meu irmão Mário pela minha cunhada Célia. Morreu Mário e Célia matou-se, para segui-lo. Outro caso: O da minha tia Iaiá pelo meu tio Chico. Este era por assim dizer um bêbado nato e hereditário.


Mesmo sem beber, continuava embriagado. Era um homem que, nas suas crises de alcoólatra, enfrentava a polícia montada, derrubando cavalos e enfrentando a multidão. Mas era só Iaiá aparecer para que aquele possesso, de repente e mansamente, saísse atrás dela. Nunca Chico elevou a voz para Iaiá.

Sempre foi o homem magnetizado pelo amor: era diante dela um menino patético e tão órfão. Aos 80 anos, ele era um namorado bêbado, mas namorado. E assim ele morreu e assim ela morreu com o amor que continua para além da vida e para além da morte, como Mário e Célia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário